Notícias do Tocantins – O bispo da Diocese de Cristalândia, Dom Wellington de Queiroz, manifestou “profundo repúdio e indignação” diante da ação da Polícia Militar do Tocantins no acampamento Beatriz Bandeira, em Marianópolis, no Vale do Araguaia. O episódio ocorreu na última segunda-feira (18/8), quando um efetivo policial foi enviado ao local, onde cerca de 100 famílias ocupam uma área considerada pública federal.
Segundo nota divulgada pela Diocese e pelo Centro de Direitos Humanos Dom Heriberto Hermes, a operação representou “um violento ataque aos direitos humanos e à dignidade” das famílias acampadas. Quatro pessoas foram presas – entre elas uma mãe com a filha recém-nascida – e liberadas apenas à meia-noite.
“A presença do fazendeiro e de seu advogado durante a operação policial evidencia a preocupante conivência entre o poder público e interesses privados, configurando grave afronta ao Estado Democrático de Direito”, destacou o documento assinado pelo bispo.
Dom Wellington pediu a imediata apuração dos excessos atribuídos aos policiais e a proteção das famílias acampadas, além da destinação da área pelo Incra para fins de reforma agrária. “Manifestamos nossa solidariedade irrestrita às famílias acampadas e exigimos das autoridades competentes a adoção imediata de providências. Seguiremos vigilantes, na certeza de que a luta pela terra é legítima e necessária”, afirmou.
O QUE DIZ O MST
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Tocantins denunciou que a ação policial ocorreu sem decisão judicial e contou com o acompanhamento do fazendeiro, de seu advogado e de funcionários da fazenda. O movimento reforçou que o lote 24, área ocupada, é terra pública da União e já foi vistoriado pelo Incra para fins de assentamento.
“O que aconteceu foi uma tentativa de intimidação. As famílias querem apenas que a terra, reconhecida como pública, seja destinada à reforma agrária”, afirmou a direção estadual do MST, acrescentando que os acampados permanecem no local, “aflitos e preocupados com o que pode acontecer”.
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O QUE DIZ O INCRA
Em nota, o Incra esclareceu que o Lote 24 da Gleba 2 do Loteamento Marianópolis é terra pública federal e será destinado ao Programa Nacional de Reforma Agrária, com a criação de um assentamento para seleção de candidatos e distribuição dos lotes.
O órgão informou que não foi comunicado previamente da ação de despejo realizada pela Polícia Militar no dia 18/08, um dia após a ocupação das famílias. Após o ocorrido, representantes do Incra e o Ouvidor Agrário da PM estiveram em Marianópolis para verificar a situação.
O Incra destacou ter entregue documentos que comprovam a posse da União sobre a área, incluindo cópia da Ação Civil Originária nº 478, transitada em julgado, na qual o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou nulo o título emitido pelo Itertins a particulares. A decisão determinou o cancelamento da matrícula registrada em nome de terceiros e estendeu a nulidade a todos os negócios e registros subsequentes, uma vez que a área já havia sido arrecadada pela União.
As famílias foram orientadas a permanecer fora da área até a criação oficial do assentamento e a seleção de beneficiários. Para evitar novos conflitos, a Câmara Nacional de Conciliação Agrária do Incra encaminhou ofício à Secretaria de Segurança Pública e ao Comando-Geral da PM, solicitando providências.
O QUE DIZ A POLÍCIA MILITAR
A Polícia Militar justificou sua atuação com base no artigo 1.210 do Código Civil, que prevê o chamado “desforço possessório imediato” – a retomada da posse por quem se declara dono, sem necessidade de ordem judicial.
A corporação negou o uso de violência e afirmou que sua função foi apenas garantir a segurança no local e evitar excessos. Em nota, destacou que “todas as ações são pautadas por protocolos técnicos e absoluto respeito aos Direitos Humanos” e acrescentou que continua acompanhando o caso em conjunto com o Incra e representantes dos movimentos sociais.
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Nota da Polícia Militar na íntegra:
“A Polícia Militar do Tocantins (PMTO), em resposta aos questionamentos sobre a atuação no Acampamento Beatriz Bandeira, em Marianópolis, esclarece os fatos:
A PMTO informa que foi acionada na data de 18 de agosto para atender a uma ocorrência de esbulho possessório em uma propriedade rural cujo solicitante apresentou documentação da terra e afirmou que a posse era exercida de forma legal e pacífica pelo mesmo no local.
A atuação da corporação se deu em estrito cumprimento da lei, para garantir a segurança e o exercício do desforço possessório imediato, prerrogativa legal assegurada ao possuidor pelo Artigo 1.210 do Código Civil. Tal dispositivo autoriza a autodefesa da posse, desde que realizada de forma imediata e proporcional, não exigindo prévia ordem judicial para sua execução. A função da Polícia Militar, nestes casos, é garantir que o exercício desse direito ocorra sem excessos e dentro da ordem pública.
A PMTO reitera que todas as suas ações, especialmente em situações de conflito agrário, são pautadas por rigorosos protocolos técnicos e pelo absoluto respeito aos Direitos Humanos. Alegações de ameaças ou violência por parte do efetivo policial são infundadas e não correspondem à conduta adotada na operação.
Informa, ainda, que neste momento o Oficial Agrário da PMTO esteve em reunião na cidade de Marianópolis, junto com representantes do INCRA e dos Movimentos Sociais para definição sobre destinação de todos. Ressaltamos que o INCRA está à frente das negociações.
A Polícia Militar do Tocantins reafirma seu compromisso com a atuação técnica, imparcial e legal, visando a manutenção da ordem e a garantia dos direitos de todos os cidadãos.”